domingo, 4 de outubro de 2009

A Mulata

Daniel Antunes Júnior
É notória a influência dos lusitanos pelas escurinhas. Isso ficou patenteado desde o tempo da colonização do Brasil. Por exemplo, o Visconde do Jequitinhonha, tribuno da mais alta categoria, era filho de um comandante português e de uma negra, possivelmente escrava.
O abolicionista José do Patrocínio, notável jornalista, também era pardo, filho de uma escrava alforriada e de um cônego português.
E o poeta satírico Gregório de Matos, filho de português, não perdoava uma negrinha bem apanhada...
Essa indefectível gamação dos portugueses pelas escurinhas da África tem servido para anedotas interessantes.
Contam que certa vez, para capturar onças que estavam dizimando o gado - sabendo que elas gostam muito de carne - mandaram fazer uma armadilha, colocando dentro dela algumas negrinhas, como isca. Na manhã seguinte, quando foram lá, o mundéu estava “assim” de portugueses...
O nosso saudoso amigo, deputado federal padre Pedro Maciel Vidigal, grande intelectual e pensador - uma das mais fulgurantes inteligências e culturas do nosso Estado - escreveu em seu livro “Minha Terra e Minha Gente”:

“No ano de 1788, havia em Minas Gerais mais de 175.000 escravos (homens e mulheres)... Entre eles, havia o raçador, o reprodutor que tinha como função aumentar, nas senzalas, o plantel de bons operários para qualquer tipo de serviço.
Para o ofício de paridoras, eram compradas negrinhas de 14 a 18 anos de idade, das quais, muitas vezes, usavam e abusavam os sinhozinhos e alguns de seus papais responsáveis pelo aparecimento de mulatas bonitas e sensuais que, com o máximo de tentação, ofereciam a eles (especialmente aos portugueses) o máximo de oportunidade para o pecado.
Foram elas, esquentadas na mais fogosa ebulição e desafiando os olhares lascivos dos garanhões, que inspiraram o poeta mineiro Renato Teixeira Guimarães, belíssimo soneto, digno de figurar entre os melhores da poesia brasileira e da língua portuguesa.
Para gozo intelectual e admiração do prezado leitor é que o transcrevemos a seguir.

MULATA! Flor estranha das senzalas,
Misteriosa rosa dos mocambos!
Tens dilúvios de amor na voz, se falas,
E incêndios de paixão nos olhos bambos.

Por tua fresca pele cor de jambos
Um cheiro quente de volúpia exalas,
Na cozinha, és mais fêmea entre os molambos
Que as brancas entre sedas pelas salas.

Freira de amor de carne hospitaleira,
Esposa oculta a que ninguém dá nome!
Noiva da mocidade brasileira...

Tu nos dá carne e fruto em nossa rede,
Eva trigueira da primeira fome,
Samaritana da primeira sede.
Tinha razão o Bispo Dom Frei Antônio de Guadalupe, (citado por Vidigal) quando exclamou: O inveterado costume da sensualidade destas Minas chega a cegar o entendimento.
A coisa atingiu tal ponto que muitas pessoas de bons costumes tinham vergonha de serem honestas e de retidão no procedimento e, logo, se afinavam pelo diapasão geral, admitindo que: Branca foi feita para casar, e negra para trabalhar. Quanto à mulata...(melhor é calar).”

sábado, 3 de outubro de 2009

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

domingo, 27 de setembro de 2009

Psicografias

Estou convencido de que, ao “psicografar” mensagens e trabalhos de pessoas falecidas, - como é o caso das obras atribuídas ao Dr. Fritz, - o medium, concentrando-se como numa profissão de fé, põe-se diante do papel e, de caneta na mão, possivelmente sem invocar especialmente este ou aquele espírito, mas “abrindo-se” a algum deles, vai escrevendo aquilo que lhe vem à cabeça.
E se convence, até mesmo de boa fé, que foi monitorado pela alma que baixou em sua mente e tomou conta dela, passando a ditar-lhe alguma coisa, ao guiar a sua mão;
Acredito que, na verdade, não terá sentido, senão por uma auto-sugestão mística, algum sinal, ou algum clique, que não se confundam com o efeito de um condicionamento semelhante a uma sensação onírica, ou mesmo ao estado de inebriante comoção, provocados pelos humores do próprio metabolismo sob tensão concentrada. Pois em tais condições, nas vigílias afervoradas, com a mente sensibilizada, somos capazes até de visões fantásticas.
Dizer que o psicógrafo, ele mesmo, não tem condições de alinhar, de sua própria lavra, os pensamentos que assim põe no papel, é subestimar a sua capacidade intelectiva. Não há nenhuma prova, nem evidência insofismável, de que tais escritos provêm de outrem que já não está entre os vivos.
No caso específico das obras do Dr. Fritz, hipotético médico alemão, (que obviamente teria escrito seus livros em alemão, se é que eles existiram) há uma contradição gritante, senão mesmo uma farsa. Ditas obras, ou os ensinamentos do autor, foram “psicografados” em português e não em alemão, língua que o seu psicógrafo não conhece.
Quem teria feito previamente a tradução? Atribuir ao Dr. Fritz a capacidade de ditar o que escreveu, ou o que pensa, numa língua que ignorou, não tem lógica.
Considerando que o Dr. Fritz não conhecia a língua portuguesa, nem o seu psicógrafo conhece o idioma alemão, teria havido algum indício de autenticidade se a psicografia tivesse sido feita em alemão, mas isso não aconteceu...

terça-feira, 18 de agosto de 2009

A ONISCIÊNCIA, SONHOS E FANTASIAS
Daniel Antunes Júnior
Somos dotados da inteligência que falta aos irracionais e temos a natural curiosidade a respeito de nossa origem, finalidade, aptidões e destino.
O sonho da imortalidade no ser humano lhe é inerente, ainda que em termos, isto é, que se faça através de suas obras. Assim aconteceu, por exemplo, com os faraós que edificaram pirâmides, preocupados em deixar após si, de alguma forma, o rastro de sua passagem por este singular planeta, de que tanto gostamos, e que certamente é o único habitado em nosso sistema solar.
Essa singularidade, aliás, dá a medida da importância da Terra e dos humanos, dotados estes de extraordinária capacidade de realização. Tanto que estamos especulando, com o emprego do poderoso Humble e de sofisticadas sondas espaciais, o que ocorre nos outros planetas e seus satélites, visando a desvendar os mistérios da criação e saber como tudo começou.
Nas academias de letras e em outros sodalícios culturais, tem sido habitual tratar generosamente a seus consócios como imortais, porque suas obras, por ventura, vão além de sua existência terrena. Lembro-me bem de que meu saudoso amigo Felipe Machado Cury, para me ser agradável, dizia, bem humorado, que eu era imortal por merecimento e ele o era porque não tinha onde cair morto!...
O homem, animal racional, bípede e mamífero ocupa o primeiro lugar na escala zoológica. Biològicamente assemelha-se aos demais mamíferos e deles se distingue por sua faculdade espiritual própria, através da qual chega à concepção das idéias universais.
Na teoria de Jung, anima é o componente feminino da personalidade de todos os seres humanos.
Curiosamente, pretende-se que só o homem tem alma (do latim anima). Os bichos não a têm, apesar de serem animais - termo derivado de anima.
Mas, vamos ao que nos interessa neste comentário.
Note-se que, volta e meia, até bons autores empregam os substantivos mente (intelecto) e alma (ou espírito, parte imaterial do ser humano), como sinônimos. Mas há uma diferença sutil entre os dois termos. Se, como dizia Lucrécio, são outros elos de união os dotes do corpo e do espírito, implicitamente admitiu ele tal diferença na dualidade. Mas não nos propomos discutir o sexo dos anjos.
Entretanto, sabemos que psiquê é palavra grega que significa alma. Lembremos, apenas para sinalizar a tênue diferença, que na mitologia greco-romana Cupido, ou Eros, apaixonou-se de Psiquê, princesa de encantadora beleza, com a qual quis se casar, resultando daí a idéia da teoria cartesiana da relação entre a alma e o corpo - a interação.
Os psiquiatras tratam das doenças mentais contando, para isso, com antipsicóticos, antidepressivos e tranqüilizantes, mais ou menos eficazes, medicamentos esses cujos ingredientes são extraídos de elementos da natureza, e que agem diretamente sobre a constituição orgânica e fisiológica do sujeito. Mas isso ainda é pouco. Os profissionais dessa área da medicina, dispõem de outros recursos terapêuticos para atender os seus clientes com distúrbios e conflitos mentais (neuroses e psicoses), seja pesquisando o seu comportamento ou vasculhando o seu inconsciente. O divã constitui símbolo dessa terapia. Mas é curioso que ninguém fale de doença almal.
Podia ater-me a outros temas da vida, por exemplo, sobre economia e finanças, já que labutei quantum satis na administração do crédito real e fiduciário dos bancos, atividade que é alheia às investigações metafísicas, cartesianas, ou simplesmente psicossomáticas, mas exige uma boa dose de habilidade psicológica.
Foi assim que, sem pretender invadir as águas dos psiquiatras, psicólogos e psicanalistas preferi, como curioso free-lance, esta ousada incursão à metafísica, que é teoria geral abstrata, e suas afinidades, fascinado pela indagação das origens, evolução, capacidade e performance do ser humano.
Sabemos perfeitamente que a geometria nos ensinou grande número de verdades, e a metafísica bem poucas. Mas vamos lá, sem qualquer pretensão novidadeira. Somos conscientes de nossas limitações. O próprio Sócrates, monumento do raciocínio (Ah, o grande Sócrates!) se apresentava como homem que nada sabia!...
Quanto à alma, disse Voltaire: “Seria maravilhoso ver a própria alma. Conhece-te a ti mesmo (esta inscrição estava gravada na fachada do templo de Delfos) é excelente preceito, mas só a Deus é dado pô-la em prática. Quem mais pode conhecer a própria essência?”
Contudo, não há dúvida que o homem se aproxima muito do criador de todas as coisas. Diz-se até que Deus o fez à sua imagem e semelhança. Pelo menos é o que consta do Genesis.
Vejamos, desde logo, esta referência lapidar:
Que obra de arte é o homem; quão nobre em sua razão; que infinito em suas faculdades; quão eloqüente e admirável em forma e movimento; como se assemelha a um anjo na atividade; e no entendimento como se parece a um Deus!
Assim falava Shakespeare, no Hamleto.
A Obra da Criação e a Onisciência
Para Tomaz de Aquino é importante considerar alguns elementos fundamentais, tais como o movimento, a causa eficiente, a noção do possível e do necessário, o grau de perfeição que se nota nas coisas e a ordem do universo.
De minha parte, entendo que Deus criou o mundo constituído de matéria e energia, e inventou a vida, tirando patente dela. Foi obra definitiva. Desde então tudo se realiza segundo uma ordem geral previamente estabelecida. Nada há de novo debaixo do sol.
O corpo humano, feito do barro da terra, de acordo com a Bíblia, representa, segundo conclusão científica, uma síntese dos principais elementos da natureza. Sem dúvida, é um prodígio. O homem, portanto, fisicamente está ligado a tudo que existe em torno dele.
Sabe como muitas coisas são feitas, mas não sabe fazê-las a seu modo, ou de outra maneira, embora tenha a seu alcance todos os ingredientes. Por exemplo, pode fabricar um grão de feijão de conteúdo e forma perfeitos, mas que não germina.
Resta ao homem o privilégio de ver as coisas acontecer e de realizar aquilo que, não sendo impossível, é possível. Como ser inteligente, constituído e organizado de maneira prodigiosa e providencial, além da faculdade do conhecimento das coisas através dos próprios sentidos, o homem potencialmente teria a visão transcendental, instantânea, de tudo que acontece no mundo, em qualquer parte, isto é, a onisciência. Como prová-lo? O raciocínio nos leva a considerações surpreendentes, ainda que não conclusivas. É bom lembrar que a matemática, como instrumento principal das demais ciências, tem por objeto, de um modo geral, a medida e as propriedades das grandezas físicas ou abstratas, e dela se valeu o judeu Baruch Espinosa, para suas notáveis conclusões filosóficas. Mas ainda resta o problema desconfortável das dízimas periódicas, que simbolizam o balizamento da capacidade humana... Afinal, o homem é limitado naquilo que é, ou que pode entender e realizar.
Ainda assim, tendo recebido do Criador o misterioso sopro de vida (energia espiritual), o Homo vivens com seus órgãos e glândulas em perfeita sintonia, fez-se indivíduo pulsante e pensante. Sequencialmente evoluiu para Homo sapiens, Homo faber, Homo ludens, Homo socialis e Homo culturalis.
Conta o homem com um cérebro e sistema nervoso que sob comando da mente lhe imprimem autonomia de pensamento e ação, em perfeita interação cartesiana de corpo e alma E é dotado, segundo certos pensadores, da capacidade de juntar aos conhecimentos por si adquiridos, a memória retroativa, isto é, o patrimônio cultural herdado dos antepassados por via genética. Além disso, acreditam alguns que não é demais concluir que esse ser singular, privilegiado, constituído de corpo e alma (corpus et anima), tenha recebido, potencialmente, o dom da onisciência. Todavia, essa faculdade originária veio a passar pelo estrangulamento de uma espécie de válvula redutora, em beneficio do próprio equilíbrio emocional.
Mas muita indagação ainda paira no ar, à espera de uma resposta definitiva.
William Blake, gravador e escritor espiritualista inglês do século dezoito, passou a vida em pobreza e acessos de loucura que lhe proporcionaram grandiosas visões, aproveitando-as para ilustrar os seus livros e os de Job, Virgílio, Dante e Chaucer. Teria ele, como antípoda da mente, transposto as portas da percepção de que nos fala Aldous Huxley? Se de fato não teve contatos imediatos com a Jerusalém Celestial, a cidade santa descrita no Apocalipse, não deixou de ser um poeta visionário. Escreveu coisas fantásticas sobre os mistérios da vida e versos de beleza extraordinária, como estes:
Ver o universo no grão de areia
E o paraíso em uma flor;
Segurar o infinito na palma de sua mão
E notar a Eternidade em uma hora.
Na “A Evolução Criadora”, sua obra prima, Henri Bergson fala do impulso vital, criador, que se aplica á matéria, e declara que os mais fecundos de todos os sistemas filosóficos têm como base a intuição.
No “Ensaio sobre os dados imediatos da consciência” e em “Matéria e Memória” ele trata da inserção do espírito no mundo material, afirmando que a integralidade do passado se conserva na memória e que o cérebro apenas filtra as lembranças úteis à ação presente. Para ele, não é a inteligência que chega a compreender a vida, mas a intuição.
Aldous Huxley em suas especulações de ordem filosófica e religiosa, falando de sua experiência com alucinógenos, cita o pesquisador de Cambridge, Dr.C.D.Broad, segundo o qual “será bom considerarmos, muito mais seriamente do que até então temos feito, o tipo de teoria estabelecida por Bergson, com relação à memória e ao senso de percepção.”
Essa teoria acrescenta que a função do cérebro e do sistema nervoso é, principalmente, eliminativa e não produtiva. E segue que cada um de nós seria capaz de lembrar-se, a qualquer momento, de tudo que já ocorreu conosco, bem como de se aperceber de tudo que está acontecendo em qualquer parte do universo. Entretanto, a função do cérebro e do sistema nervoso é proteger-nos, impedindo que sejamos esmagados e confundidos por essa massa de conhecimentos, na sua maneira inúteis e sem importância, eliminando muita coisa que, de ouro modo, deveríamos perceber ou recordar constantemente, e deixando passar apenas aquelas poucas sensações selecionadas que, provavelmente, terão utilidade na prática.
O Sonho e ilusões
Outro tema fascinante, que através dos séculos tem mobilizado tantas cabeças pensantes é o sonho - a sequência de imagens e de fenômenos psíquicos que ocorrem durante o sono.
O ato ou efeito de sonhar, propriamente dito, tem caráter involuntário e as imagens oníricas, geralmente ligadas à vida do indivíduo, constituem subsídio de grande interesse para estudos psicanalíticos.
Na mais remota antiguidade e mesmo muito tempo depois, o sonho era considerado como aviso divino, ou sobrenatural, destinado a prevenir o ser humano quanto a determinados acontecimentos.
Nos episódios bíblicos as interpretações de sonhos eram correntes e sempre foram aceitas sem discussão.
Entretanto, nos tempos modernos,vários estudos foram feitos e Freud chegou a elaborar a teoria dos sonhos, mas a sua interpretação é falha.
Como explica Huxley, a maioria dos sonhos diz respeito aos desejos e impulsos instintivos do paciente, bem como aos conflitos que surgem quando esses desejos e impulsos são frustrados por uma desaprovação do consciente, ou por um temor à opinião alheia.
A história de tais impulsos e conflitos é contada em termos de símbolos dramáticos e, na maioria dos sonhos, tais símbolos são monocromáticos. Qual a razão para isso? Suponho, diz ele, que seja porque os símbolos, para terem valor, não precisam ser coloridos. As letras com que escrevemos acerca das rosas não necessitam ser vermelhas, e podemos descrever o arco-íris por meio de sinais negros sobre o papel branco. Os compêndios são ilustrados com gravuras hachuriadas e fotogravuras a meios-tons, o que não impede possam esses diagramas e imagens monocromáticas representar as informações que se desejam.
Por extensão, sonhar também é fantasia, utopia, devaneio, ilusão. Eu, por exemplo, vivo sonhando em acertar na mega sena, pois, segundo velho adágio, um dia a casa cai...
É interessante observar que os sonhos de um homem doente tomam sempre um relevo extraordinário a ponto da própria realidade confundir-se com tais sonhos. O quadro que representam e todos os seus meandros sobre o organismo preso de excitação nervosa são de tal maneira verossímeis, cheios de minúcias tão imprevistas, tão engenhosas e tão adequadas, que o próprio individuo que os sonha seria incapaz de inventá-los acordado, fosse ele um artista da estatura de um Puchkin, ou Turgueniev.
Não é raciocinar com rigorosa lógica - diz um personagem de Dostoievsky, de maneira tão sugestiva - supor que tudo que aparece ao doente é devido ao delírio. Admite-se que as aparições não se mostram senão aos doentes. Mas isso só prova uma coisa: que é preciso estar doente para vê-las, e não que não existem na realidade.
As aparições são, de certa forma, fragmentos de outros mundos, seus embriões. Um homem com saúde não tem naturalmente razão alguma para vê-las, pois um homem são é sobretudo um homem terrestre, isto é material. Deve, portanto, ter uma vida terreal, em termos de harmonia e ordem. Mal, contudo, vem a adoecer e a ordem normal, terrestre, do seu organismo se perturba, a possibilidade de outro mundo começa logo a manifestar-se, enquanto, à medida que se agrava o mal, as relações com esse outro mundo se tornam mais estreitas até que a morte o faça penetrar nele inteiramente.
O homem, individualmente, como qualquer máquina ou entidade, tem duração limitada e está sujeito aos percalços de sua caminhada. Mas se eterniza na sua posteridade, através das gerações. Muitos gostariam de ser lembrados, através de sua obra.
Muito se tem falado e escrito de visões de quem esteve no limiar da morte, ou do outro lado da muralha e, por assim dizer, reviveu. Há quem atribui tais visões aos efeitos das drogas e ou às perturbações do cérebro enfermo.
O fato é que, exceto para os suicidas, isto é, para aqueles que perderam o controle emocional, a morte é indesejada e temida.
A razão disso é que a vida é bela, a tal ponto que muitos têm saudades antecipadas dela, como eu. Para outros o temor provem do desconhecido. Ninguém sabe o que acontece no mundo do além, pois ninguém de lá voltou para contar, a não ser Lázaro, ressuscitado ao terceiro dia da morte. Mas Lázaro nada contou de sua extraordinária experiência...

domingo, 16 de agosto de 2009

A história trágica de Amélia

Daniel Antunes Júnior

Em apêndice de meu livro “Lençóis do Rio Verde - Crônica do Meu Sertão” escrevi a história de Amélia, uma jovem tão tímida, de espírito tão sossegado e calmo, que corava de seus próprios anseios.
Amélia Pereira Freire, ou Amélia Freire Alkimin, era casada com meu tio-avô Evaristo Antunes de Souza, cujo irmão, Dom Lúcio Antunes de Souza foi o primeiro bispo de Botucatu-SP.
Não omiti nenhum detalhe do seu drama e de sua tragédia, esta registrada nos autos do processo-crime, que se encontram nos arquivos da Comarca do antigo Tremedal, hoje Monte Azul.
Abatida rudemente por seu marido, ela sofreu até a morte, sem que contasse com qualquer auxílio, nada podendo fazer senão apelar a um poder mais alto para que a amparasse naquele momento de dor e desespero.
No local de seu holocausto, logo depois de sua ocorrência, foram erguidas duas cruzes, uma maior, outra menor, simbolizando a mãe e o filho que esta trazia em suas entranhas. Há poucos anos, um conterrâneo que mora em São Paulo, devoto de Amélia, em reconhecimento por graça alcançada por sua intercessão, adquiriu o terreno, cena da tragédia, e ali construiu uma capela e um preventório destinado à população carrente.
Pairava no ar uma dúvida quanto ao procedimento da jovem e bela Amélia.
Entretanto, qualquer que tenha sido no passado a sua conduta, ninguém pode negar, em sã consciência, que a morte trágica lhe colocou sobre a fronte uma auréola de luz.
Ninguém pode duvidar que continuamente e cada vez mais, anos a fora, legiões de almas aflitas e sofredoras buscam e alcançam, na invocação de Amélia, um lenitivo para suas dores e um consolo para suas mágoas.
Na verdade, seria estranho que isto pudesse acontecer, sem que algo transcendente tivesse marcado aquele episódio sangrento, ocorrido há cento e cinco anos, na noite fria e estrelada de sexta-feira, 15 de julho de 1904.
Na memória gloriosa de seu sacrifício - a própria imagem do sofrimento que redime e santifica - vê-se que a sensibilidade popular, indiferente aos antecedentes da grande tragédia, instituiu e consagrou a devoção de Ameia, na inspirada crença de que, naquele martírio inenarrável, sua alma foi resgatada pura como o lírio dos pântanos, e resplandecente como sol que brilha no céu límpido, após a noite tenebrosa das tempestades e dos vendavais.
Sua alma goze da glória!

O Prêmio Nobel

Daniel Antunes Júnior

A Fundação Nobel - Nobelstiffelsen, é instituição sueca, regulamentada em 1900, de conformidade com as disposições testamentárias de Alfred Bernard Nobel, químico e industrial nascido em Estocolmo em 1833 e falecido em San Remo em 1896.
Ele foi o inventor da dinamite, (e sua denominação, derivada do grego dinamis - força, potência) obtendo a absorção da nitroglicerina, muito instável, por uma matéria porosa inerte. Criou posteriormente a dinamite-goma - altamente explosiva e largamente usada na indústria, na construção civil e na guerra - composta de nitroglicerina e areia.
Nobel amealhou considerável fortuna e a destinou à premiação anual, que traz o seu nome.
O ato constitutivo da Fundação é o seu testamento, datado de Paris a 27.11.1895 - um manuscrito do próprio punho do instituidor, com apenas 43 linhas.
Alfred Nobel, um amante da paz, viria a falecer no ano seguinte, deixando a totalidade de sua fortuna (mais de 30 milhões de coroas) a um fundo, cuja renda deveria ser distribuída anualmente aos que, no decurso do ano anterior, houvessem “proporcionado maior benefício à humanidade.”

DISTRIBUIÇÃO DA RENDA
A renda seria dividida em cinco partes iguais, a serem distribuídas da seguinte forma: uma parte a cada um dos que houvessem feito a mais importante descoberta ou invenção, ou tivessem dado a melhor contribuição para o desenvolvimento da física, da química e da fisiologia ou medicina; uma parte a quem produzisse a melhor obra no campo da literatura, e uma parte a quem tivesse desenvolvido o máximo esforço no sentido de promover a fraternidade das nações, a abolição ou redução dos exércitos permanentes e a formação e propagação de um congresso de paz.
Não há dúvida de que o Prêmio Nobel é a mais notável láurea concedida a indivíduos ou instituições que se destacaram nas respectivas áreas da cultura universal.
A propósito lembremos que láurea ou laurel é expressão derivada do latim laurus (loureiro), cujas folhas coroavam os generais vitoriosos - os heróis da Roma antiga.
Por suas características singulares, ao distinguir cidadãos do mundo por seu talento e seu trabalho visando ao progresso e ao bem estar da sociedade humana, independentemente de sua nacionalidade, os prêmios Nobel, a partir de 1901, conferem aos agraciados sólida e definitiva reputação.
Indiscutível é o nível artístico, técnico e científico dessa que é a maior promoção da inteligência, da operosidade e da capacidade criativa do ser humano, aferido pela Real Academia Sueca de Ciências, pelo Instituto Médico-Cirúrgico Karolinska e ainda pela Comissão Nobel do parlamento norueguês.
Significativo e louvável é o caráter universal, equitativo e livre, da premiação. Basta dizer, por exemplo, que o prêmio de Literatura, desde a sua instituição, já foi outorgado a escritores de nada menos de quarenta países espalhados pelos cinco continentes. O campeão foi a França, com 12 prêmios, seguida de perto pelos Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido.

NA TERRA DOS VIKINGS
Para divertir o leitor, e sem pretender desviar o rumo ou o tom comedido desta exposição, abro espaço para narrar um fato pitoresco e bem humorado. Num tour pela Europa, tive a idéia de trazer um souvenir de cada Pais.
Assim, ao chegar à Escandinávia, já havia adquirido, em Roma, a miniatura da loba amamentado Remo e Rômulo; em Paris, a da Torre Eiffel; em Madrid, a de um touro negro e chifrudo; em Lisboa, a do Galo de Barcelos; em Copenhagen, a da Pequena Sereia; em Londres a do soldadinho que guarda a rainha, no Castelo de Windsor, além de outras.
Chegara a vez de adquirir uma lembrança da terra dos Vikings, grandes navegadores. Então, perguntei à nossa graciosa cicerone:
- Por que será que os vikings usavam chifres?
Ela pensou um pouco e depois respondeu, de maneira surpreendente:
- Sei não... Mas acho que é porque eles viajavam muito...

O LOCAL DAS PREMIAÇÕES
Tive o privilégio de conhecer, pessoalmente, em Stokholmo, o local e as magníficas instalações em que são realizadas as imponentes solenidades da entrega dos prêmios Nobel, todos os anos, com as interrupções verificadas durante as duas guerras mundiais. As instalações são primorosas, dignas da magnificência do grande evento.
A premiação tem valor monetário significativo, mas condicionado às rendas do fundo. Entretanto, seu valor simbólico é incalculável.

À outorga do Prêmio Nobel não faz sombra a consagração conferida aos virtuoses das artes plásticas e da escultura, que deslumbram multidões nas melhores galerias e museus dos grandes centros; nem tão pouco a popularidade e renome alcançados por compositores, artistas e intérpretes que deleitaram e deleitam tantos aficionados da música, do balé e dos concertos sinfônicos no Alla Scala de Milão, na Opera de Paris, ou no Couvent Garden de Londres - para só falar dos mais importantes teatros de ópera e de espetáculos do mundo.
Em tais ambientes de refinamento se elevaram à glória Rossini, Donizetti, Verdi, Toscanini, Nijinski, Pavlova, Galina Ulanova, Isadora Duncan, Caruso, Maria Callas e tantos outros que atuaram magistralmente, mas diante de um público privilegiado.
E ainda, não lhe chega aos pés o cobiçado Oscar da Academia Cinematográfica de Holywood, que galardoa, com pompa e circunstância e sob grande publicidade, os expoentes máximos da sétima arte - a mais notável e acessível das atrações populares dos tempos modernos.

Como se vê, o prêmio Nobel, está voltado para o progresso da humanidade e, sem grande alarde, foi inspirado e mantido pela sensibilidade de um nobre cidadão, inicialmente para cinco agraciados anuais. Atualmente são seis as suas categorias e, de certa forma, tem alcance maior do que qualquer outro prêmio de incentivo à cultura. São elas: de Economia, Física, Literatura, Medicina, Paz e Química.

O PRÊMIO NOBEL DE ECONOMIA
O prêmio Nobel de Economia, também chamado de Prêmio Severiges, foi instituído em 1968 pela Real Academia de Ciências Sueca, às expensas do Banco Central da Suécia - o Severiges Riksbank . Foi uma homenagem à memória de Alfred Nobel, que além de ter sido considerado um cidadão superidealista, foi empresário bem sucedido do ponto de vista econômico, revelando-se grande mecenas. Esse prêmio começou a ser distribuído no ano seguinte, 1969, e até 2006 completou o total de 58 premiações das quais os Estados Unidos ficaram com nada menos de 38.
Inegável, o acerto dos temas escolhidos.Segundo as melhores definições,
Física é a ciência que estuda as leis que regem os fenômenos naturais susceptíveis de ser examinados pela observação e experimentação, procurando enquadrá-los em esquemas lógicos;
Química é a senhora e escrava do homem. Do berço ao túmulo é o homem completamente governado por suas ações e reações. É estudo científico da constituição da matéria, suas propriedades e transformações substanciais. Seguindo suas leis, o homem, em proveito próprio, manipula os elementos, em combinações que variam ao infinito.
Medicina é arte e ciência de curar ou atenuar as doenças; Fisiologia é parte da Biologia que estuda as funções dos organismos dos seres vivos, animais ou vegetais.
Paz é a tranqüilidade pública, concórdia, sossego, cessação de hostilidade, silencio, descanso; a própria bem-aventurança;
Economia é a boa ordem em qualquer administração particular ou pública; a harmonia das partes com o todo. Em ouros termos, é o poder que governa o mundo; e
Literatura fala de tudo isso e o céu também.
Em suma, a competição dos Prêmios Nobel é uma espécie de olimpíada cultural, de que podem participar nacionais de todos os continentes. E o dinamismo da premiação é assegurado pela circunstância de contemplar as produções, ou sua ressonância, do ano precedente.
Sem dúvida alguma, a outorga do Prêmio Nobel reflete a qualidade de um país, suas aptidões e seu desenvolvimento global - cultural, econômico, técnico e científico, pondo em destaque o gênio inventivo e a capacidade criativa de seus filhos.

O RANKING DOS PREMIADOS
Eis o ranking dos países que, segundo página da Internet, mais ganharam o prêmio Nobel, desde a sua instituição até 2005:
Países Econ. Física Liter. Med. Paz Quím. Total
USA 37 75 10 82 19 52 275
R.Unido 8 22 10 28 12 25 105
Alemanha 1 22 8 15 4 27 77
Suécia 2 4 6 8 5 4 29

A primeira premiação, em 1901, foi a seguinte: de Física a W.C. Röntgen da Alemanha; de Literatura a Sully Prudhomme, da França; de Medicina e Fisiologia a Von Bering, da Alemanha; de Paz a H.Dunant, da Suíça; e de Química a Van t´Hoff, dos Países Baixos.

PRÊMIO NOBEL DE LITERATURA
Atemo-nos ao mais charmoso dos prêmios Nobel, destinado a pessoas que “no domínio da literatura compuseram, no ano anterior ao da premiação, a mais notável obra de inspiração idealista”, independentemente de sua nacionalidade, raça, língua e convicções religiosas.
Observa a Editora Delta, responsável pela publicação da coletânea dos prêmios Nobel em português (com capa de Picasso), que a concessão anual do maior galardão da republica universal das letras, é acolhida com interesse cada vez mais intenso. Os motivos da decisão, a personalidade e a obra do laureado, as discussões precedentes à outorga do laurel, a maneira por que é atribuído, excitam a natural curiosidade dos leitores cultos do mundo inteiro.
A extensa relação de laureados do Prêmio Nobel de Literatura pode ser considerada como representativa da evolução verificada neste setor, em cada país.

OS AGRACIADOS MAIS CONHECIDOS
Ao longo dos anos, dentre os autores agraciados, os mais conhecidos e de diversas nacionalidades, foram: Bernard Show, Fulkner, Gide, Hemingway, Henri Bergson, Hermann Hesse, Kipling, Maeterlinck, Mauriac, O´Neil, Pasternack, Pirandelo, Rabindranath Tagore, Romain Rolland, Sartre, Selma Langerlof, Steinbeck, Sienkiewicz, T.S Eliot, e Thomas Mann.
Dos latino-americanos tivemos:Gabriela Mistral e Pablo Neruda, do Chile, Miguel Angel Astúrias, da Guatemala, Gabriel Garcia Marquez, da Colômbia.
A literatura pode ser equiparada ao retrato falado de um povo, pois reflete o rolar de sua vida, sua cultura, sua história, seu folclore, suas tradições, seus usos e costumes através dos tempos.
E de todas as suas modalidades, em todo o mundo, destaca-se o conto. Um conto bem estruturado pode ser o resumo de um romance.
Sua popularidade deriva do fato de ser uma narrativa curta, sucinta, para ser lida de uma assentada. Guimarães Rosa batizou-a de sagarana, termo composto de saga (lenda ou narrativa de origem escandinava) e rana (pospositivo de origem tupi que significa semelhante, parecido a).
Alguns dos agraciados do Nobel escreveram contos e não apenas romances ou novelas. Dentre eles, destacamos o polonês Henryk Sienkiewicz, autor do romance histórico, o mundialmente famoso Quo Vadis?. Todavia, tomou-se por base o seu delicioso conto “O Faroleiro” e outros, cujo volume foi publicado como uma de suas obras mais importantes.

AUSÊNCIA DO BRASIL
A difusão de uma literatura além de suas fronteiras é obstada, obviamente, por dificuldades lingüísticas. Muitas vezes, ao serem passadas para outro idioma, a obra perde parte do seu sabor. Entretanto, este não é um problema incontornável.
Mas, lamentavelmente, o Brasil ainda não se fez presente em nenhuma das categorias do Prêmio Nobel, nem mesmo na de Literatura, apesar de nossa cultura geral e de termos tantos escritores primorosos, como Machado de Assis, Carlos Drumond de Andrade, Jorge Amado, Guimarães Rosa e muitos outros, muitos dos quais tiveram edições em línguas estrangeiras.
Guimarães Rosa, por exemplo, foi traduzido em diversas línguas e sua obra é mundialmente conhecida e apreciada...
Em toda a América do Sul, além da Argentina, com um prêmio da Paz, outro de Medicina, até o momento apenas o Chile, com Gabriela Mistral e Pablo Neruda; a Guatemala com Miguel Angel Asturias, e a Colômbia com Gabriel Garcia Marquez, fazem parte desse Clube seleto da cultura universal, com prêmios de Literatura.
O critério de seleção e eleição dos postulantes é exigente e não pode ficar à mercê de aventureiros, inclusive autores que se valem de bem montado marketing editorial, com feroz e rica publicidade, para auto-promover-se.
Na Literatura, como em qualquer outra atividade criativa, é preciso separar o joio do trigo. O joio, coisa ruim, daninha, é sempre invasor e prejudica o que há de melhor.
Assim, as indicações devem recair em obras de real mérito, e ser bem fundamentadas, levando o aval e a chancela de instituições realmente idôneas.
Contamos com um manancial de bons autores, que se equiparam aos melhores do mundo inteiro, e não se compreende porque ainda não temos o prêmio Nobel, pelo menos o de Literatura.
A verdade é que, para todas as categorias, não nos faltaram bons candidatos, tais como: Cesar Lattes e Santos Dumont, para Física; Adelino Leal (o professor que ensinava no laboratório), de renome internacional, mas infelizmente esquecido no Brasil, para Química; Carlos Chagas, Oswaldo Cruz, Hilton Rocha, Ivo Pitangui e Zerbini, para Fisiologia e Medicina; Marechal Rondon e Rui Barbosa, para a Paz; Roberto Campos e Eugênio Gudin, para Economia, e Guimarães Rosa e tantos outros para Literatura.
Não devemos esperar que um prêmio dessa magnitude nos caia do céu, de mão beijada...
Ainda é tempo de nossas Academias de Letras, Universidades e outras Instituições arregaçarem as mangas, com a colaboração do Itamarati - o Serviço Diplomático -, disputando um lugar ao Sol para nossa Pátria, nessa grande maratona da inteligência e da cultura universais.
Os bons ventos não contemplam aos que dormem...

A burrice é uma ciência

De tanto ver pessoas burras mandando em homens inteligentes, que às vezes penso que a burrice é uma ciência. Rui Barbosa

O barato da vida

O grande barato da vida é olhar para trás e sentir orgulho de sua história. Carlos Drumond de Andrade.

sábado, 11 de julho de 2009

Atividades profissionais e culturais

Daniel Antunes Júnior, nascido em Espinosa, Norte de Minas, é bancário aposentado, administrador e fazendeiro. Jornalista amador, colaborou em diversos jornais e revistas da Capital e do interior. Como escritor, seu livro de estréia foi “Lençóis do Rio Verde - Crônica do meu Sertão“, publicado pela Editora Comunicação, com edição esgotada, sendo cogitada segunda edição, graças ao bom acolhimento da crítica literária e dos leitores.
Está lançando, pela Editora Lithera Maciel, o seu segundo livro, intitulado “Coração de Prata - Contos Correntes”. Como o próprio nome indica, é um livro de contos.
Fez diversos cursos de administração, inclusive nos Estados Unidos, (Saving and Loan) como bolsista. Desempenhou diversos cargos de executivo bancário, como diretor de estabelecimentos de crédito. Foi diretor das Associações Comerciais de Ponte Nova, Uberlândia e de Minas Gerais, da Abecip e do Pampulha Iate Clube.
Quando presidente da Caixa de Aposentadoria dos funcionários do Banco de Minas Gerais (previdência privada) elaborou um plano original para compra de automóveis - o consórcio até então inteiramente inédito - que hoje é largamente adotado e difundido em todo o Brasil, vindo, em conseqüência, a ser regulamentado pelo Banco Central e institucionalizado por leis federais.
Como genealogista por vocação, há muitos anos vem reunindo dados para composição e edição do Catálogo Genealógico das famílias Antunes e Tolentino, a partir dos ancestrais mais remotos conhecidos. Os Antunes, da estirpe do rabi Heitor Antunes, descendente dos Macabeus, que fugindo da Inquisição aportou e se radicou na Bahia, vindo em companhia do Governador Geral, Mem de Sá. E os Tolentinos, da linhagem do Alferes José Nicolau Tolentino , que foi integrante da esquadra francesa, comandada pelo contra-almirante Willaumés e o príncipe Jeròme Bonaparte, irmão de Napoleão, para uma invasão na Bahia, e por aqui ficou. Da Bahia e do Norte de Minas as duas famílias disseminaram -se por todo o Brasil..
O autor, com a categoria de Historiador, é membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, do qual exerceu o cargo de primeiro Vice-Presidente por dois mandatos; é membro da Arcádia de Minas Gerais e sócio correspondente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e do Instituto Genealógico da Bahia. Foi Governador Distrital do Lions Internacional e participa da Academia Mineira de Leonismo; foi eleito sócio efetivo da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, cargo do qual ainda não tomou posse.
Recebeu diversas condecorações:
Medalha de Honra da Inconfidência
Grande Medalha da Inconfidência
Medalha Santos Dumont - grau de prata
Medalha Santos Dumont - grau de ouro
Medalha do 150º da Revolução Liberal de
1842 (Gov.São Paulo)
Medalha Israel Pinheiro
Award to District Governor - Lions Internacional.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

LENÇÓIS DO RIO VERDE

Daniel Antunes Junior
Lençóis do Rio Verde, hoje município de Espinosa, minha terra natal, no Norte de Minas, fronteira com a Bahia, foi distrito do antigo município e comarca de Tremedal, hoje Monte Azul.
Referido distrito e termo judiciário daquela Comarca, desfrutava de uma aristocracia rural liderada pelas famílias Antunes e Tolentino, cujos patriarcas contratavam professores de fora, para proporcionar aos filhos e filhas esmerada educação, e ainda mandavam estes, em viagens a cavalo, a estudar em Diamantina ou em Botucatu, em São Paulo.
O coronel Heitor Antunes, era descendente do rabi homônimo, que se dizia da linhagem dos Macabeus e que aportou na Bahia fugindo da Inquisição, vindo a ser mais tarde vítima dela; e Joaquim Tolentino, descende do alferes José Nicolau Tolentino, que chegou ao Brasil como integrante de uma força expedicionária a serviço de Napoleão, para frustrada invasão da Bahia (pouco antes da vinda de Dom João Vl), e por aqui ficou, como desertor.
Esses dois pró-homens eram os expoentes máximos de referidas famílias e desfrutavam do maior prestígio, inclusive junto ao governo do Estado. Foram eles os responsáveis pela criação do novo município.
No distrito as coisas corriam bem, com sua economia baseada na cultura e beneficiamento do algodão, levado em fardos, em lombo de burros, às distantes fábricas de tecidos.
O algodoeiro era muito resistente à irregularidade ou falta de chuvas, a produção incrementava os negócios e a prosperidade alimentava o progresso.
Recorda-se que, com o advento dos teares mecânicos, da revolução industrial da Inglaterra, essa fibra têxtil natural, passara de uns 7% para cerca de 80% na manufatura de todo tipo de pano no mundo inteiro, ensejando, com isso, grande procura do chamado ouro branco.
Para beneficiamento e prensagem do produto, havia no distrito inúmeras máquinas puxadas a bois, pois ainda não contavam com motores a explosão, ou eletricidade.
Além do renome do notável escritor Antonino da Silva Neves e de Dom Lúcio Antunes de Souza, 1ª bispo da Diocese de Botucatu-SP, ambos de Lençóis do Rio Verde, este Distrito se destacava, em todo o extremo Norte de Minas, graças à atuação e reputação do Pe. Guilhermino José Tolentino, filho da terra, e seu vigário por mais de 48 anos.
Dois fatos significativos marcaram aquela época de ouro de Lençóis do Rio Verde.
Primeiro, a sede da Comarca foi transferida para o distrito; segundo, o governo do Estado, com o advento do automóvel, mandou construir uma das nossas primeiras estradas de rodagem, com toda a técnica da época, ligando Lençóis a Morrinhos, hoje Matias Cardoso, às margens do São Francisco. É que, para se chegar à Capital do Estado, dando uma volta enorme, os lençoenses iam de carro, ou a cavalo, até Morrinhos, lá tomavam o vapor que os levava até Pirapora, e dali rumavam de trem de ferro para Belo Horizonte.
O coronel Donato Gonçalves Dias, que era o poderoso chefe político em Tremedal, sempre foi absolutamente contrario à emancipação de Lençóis do Rio Verde - o mais florescente distrito da Comarca - e não fazia segredo disso. E o Pe. Guilhermino, que seria elemento chave para a sonhada emancipação, mantinha-se neutro e reticente...
O motivo era simples. O padre, que mantinha relacionamento cordial com Donato, tinha uma mulher teúda e manteúda e era pai de dois filhos com ela: o conhecido Tone do Padre e o Mário - este, provavelmente, por adoção. Embora isso fosse um segredo de polichinelo, Guilhermino receava que Donato, com a sua autoridade, o denunciasse junto ao bispo da Diocese, trazendo-lhe problemas.
A verdade é que Clemência, a mulher do padre, era recebida por toda a sociedade local como uma dama de respeito, sem qualquer restrição.
Mas um dia, por fas ou nefas, o bispo da Diocese o chamou a Montes Claros, para uma conversa e esta teria sido nestes termos:
- Chamei-o aqui, padre, porque soubemos que o senhor vive maritalmente com uma mulher. É verdade?
Guilhermino, que adivinhara de saída o motivo da convocação, com humildade, cabeça baixa, mas resoluto, respondeu:
- Esta indagação do meu bispo e senhor me deixa profundamente contristado. Se eu disser que é mentira, estarei faltando com a verdade; se digo que é verdade estarei faltando com o respeito a Vossa Excelência Reverendíssima...
- Meu filho, conheço o seu trabalho pastoral e as fraquezas humanas. Vá em paz. Fique com Deus. Mas é preciso muito cuidado, muita discrição...
Sentindo-se libertado de seus receios, o Pe. Guilhermino apoiou a emancipação. Mas os burocratas do antigo Departamento de Estatística do Governo impôs uma condição: que o nome do novo município fosse mudado para Espinosa, em homenagem ao bandeirante Francisco Bruzza Espinosa, que comandou a primeira expedição exploratória deste imenso território, dede o descobrimento. Sem outra alternativa para a realização do grande sonho, a imposição foi aceita. E lá se foi, espinhosamente, uma bela denominação, tradicional, evocativa e até poética!...
Bruzza Espinosa e o Pe. Aspilcueta Navarro realmente perlustraram a região trezentos anos antes da fundação de Lençóis do Rio Verde, e a trezentos quilômetros de distância dele.
Não foi somente Lençóis do Rio Verde que sofreu a ação pretensiosa, arbitrária, insolente, descabida e desrespeitosa aos fundamentos históricos da toponímia autêntica em nosso Estado. Na mesma fornada, os burocratas novidadeiros torraram impunemente os nomes tradicionais de Brejo das Almas, Calambau, Rio Preto e outros. Infandum!

APRESENTAÇÃO

Daniel Antunes Júnior é administrador, ex-bancário, atualmente fazendeiro e, nas horas vagas, historiador, genealogista e escritor no gênero de crônicas. Seu livro de estréia “Lençóis do Rio Verde – Crônica do Meu Sertão”, edição esgotada, está sendo cogitado para a segunda edição, tão logo venha a lume o seu já programado “Coração de Prata – Contos Correntes”.
Como historiador, está promovendo a restauração do Livro
do Tombo, manuscrito de 1819, que registra o patrimônio territorial do morgadio do VI Conde da Ponte, abrangendo cento e sessenta léguas de terras, que vão desde o Morro do Chapéu, situado na parte central da Bahia – Chapada Diamantina, até as nascentes do Rio das Velhas, em Minas Gerais.
Como cronista, já atuou em diversos jornais da Capital e do Interior, cogitando-se, igualmente, de enfeixar em volume especial, atendendo a pedidos, as “Crônicas Gorutubanas”, publicadas ao longo de sete anos.
Embora tenha produzido alguns sonetos (prefere o tipo italiano – o de dois quartetos e dois tercetos rimados) não se considera poeta, nem se sente à vontade com essa classificação. Entende que ser poeta é ter a inspiração e a virtuosidade que não contemplam, indistintamente, a qualquer versejador. E no sentido trivial e prosaico – quase depreciativo – “ser poeta” se equipara a ser visionário, algo quixotesco.
Ex-governador distrital do Lions Internacional, é membro da Arcádia de Minas Gerais, da Academia Mineira de Leonismo e do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Eleito para a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, ainda não tomou
posse. (Nota de apresentação do ensaio publicado na Revista da Arcádia de Minas Gerais,intitulado “O Amor, a Amizade e o Casamento”)

COMO SOU

Comprazo-me de ser um homem normal, limpo, enxuto, de hábitos saudáveis.
Com efeito, não sou cego, nem surdo-mudo.
Não babo, não fungo, não tenho o bafo de onça dos pinguços, já que bebo com moderação, dando preferência aos vinhos, sobretudo os tintos e secos. Também não exalo o ranço sarrento da nicotina, pois não fumo. Não tenho chulé, não tenho cc ou catinga no sovaco, não tenho mau hálito. Não sou mofino, nem ladino.
Enfim, não fedo, sem embargo de que, como dizem, ninguém sente os próprios cheiros.
Posso até roncar, mas meu sono é leve e tranqüilo e me acordo logo, com o barulho do próprio ronco.
Não tenho hemorróidas, nem pé chato, nem tique nervoso.
Não sou lerdo, nem dorminhoco, nem sonâmbulo, nem desmemoriado, nem retardado, nem inocente, nem indiciado, nem culpado.
Não sou banguela ou dentuço, nem careca, nem cangalha, nem canhoto, nem corcunda, nem fanhoso, nem gago, nem daltônico, nem vesgo, nem zarolho.
Não sou gordo nem magro. Meu peso é normal, eis que tenho l,78 m de altura e há 30anos peso 78 quilos. Cintura 90. Apenas tenho uma barriguinha de veludo.
Como e bebo ao natural, sem esganação,isto é, não sou inapetente, nem edaz, nem guloso, nem voraz. Sou calmo e sei ouvir e calar de acordo com as circunstâncias. Minha voz tem o tom normal, sem aspereza. Quando falo, gesticulo o suficiente, sem afetação. Também não sou agnóstico, nem ateu, nem carola, nem fanático, nem descrente.
Não sou acanhado, nem assanhado, nem enxerido. Trago minhas unhas habitualmente aparadas, a barba feita e a roupa limpa. Já usei bigode, mas não uso mais.
Minha pele é clara e macia e meus cabelos, outrora castanhos, são lisos e soltos, não glostorados ou empapados.
Gosto de tomar banho, de ver as estrelas, dos perfumes discretos, das flores, das frutas, da chuva, da música, das mulheres, dos cães, da amizade e da sinceridade, da cor verde, das minhas coisas, sem ser demasiadamente apegado a elas.
Mas sou conservador. Há 50 anos moro em Lourdes, à Rua Felipe dos Santos, 42, e com a mesma mulher.
Creio que a minha família é a melhor do mundo.
Desfruto de boa memória e aprecio as pessoas inteligentes.
Não me considero inferior a ninguém. Tenho a mente aberta, mas não tenho o corpo fechado e sou alheio a superstições. Acho bom espirrar, às vezes estrepitosamente, mesmo sem uso do rapé. Mas não acredito que, ao fazê-lo, estou espantando o capeta.
Não sou tão jovem como fui, nem tão velho como espero vir a ser.
Enfim, gosto da vida e, quando partir desta para outra, sentirei saudade dela. Creio que este mundo é o melhor de todos os que conheço...